sábado, 25 de junho de 2016

17.01.1981 ─ Trens da Rede se chocam e há pânico e 37 feridos

   
Descarrilados, os vagões de passageiros por pouco não tombaram de todo

Trens da Rede se chocam e há pânico e 37 feridos

Trinta e sete pessoas feridas e estragos generalizados em uma máquina e dois vagões, é o saldo do choque entre dois trens da Rede Ferroviária Federal, na manhã de ontem, no pátio de manobras da estação de Gongo soco, a 12 quilômetros do centro de Barão de Cocais.

Os primeiros levantamentos feitos pela polícia no local revelam que houve o acidente porque o funcionário responsável esqueceu-se de virar a chave de desvio, às 6h, quando o noturno de prefixo RO-020, comandado pelo maquinista Ivani Roberto Martins, estava para chegar à estação de Gongosoco. Por pouco, a antiga mina de outro de Barão de Cocais não teve um dos mais graves desastres de trens em sua história, uma vez que vários outros já foram registrados ali.

O choque não foi violento porque o trem cargueiro, carregado de ferro e combustível, que ia de Belo Horizonte para Vitória, estava parado na estação. O cargueiro de prefixo FOA-2029, comandado pelo maquinista Manoel Borges da Silva, com 60 vagões, aguardava a passagem do noturno, que estava atrasado em mais de uma hora. O noturno saiu da estação de Barão de Cocais 20 minutos antes do choque. Como no local existe um aclive, o trem ia deVagar para chegar a Gongo Soco. A sinalização luminosa estava ligada, mas supõe-se que havia neblina na serra e o maquinista não observou o sinal de "pare" e, mesmo assim, ainda encontrou a chave de desvio desativada.

Informações de pessoas que vinham de Vitória dão conta de que, nos 16 vagões do trem de passageiros, viajavam mais de 1.800 pessoas, a maioria delas em pé. Tão logo ocorreu a colisão, várias pessoas começaram a viver um grande pânico. E depois, ao tomarem conhecimento de que o guarda-chave da estação tinha esquecido de acionar a chave de desvio, muitos dos passageiros queriam seu linchamento.

Os mais exaltados queriam "pegar" os funcionários da Rede Ferroviária Federal, principalmente o agente de serviço no horário da colisão: João Batista Miguel. O operador do aparelho, utilizando o código Morse, conseguiu informar, às demais estações, do desastre e a Rede providenciou, com muita rapidez, um pelotão de guardas, bem armados, que chegou a Congo Soco menos de 20 minutos depois do acidente.

Os guardas da Rede conseguiram dominar o pequeno tumulto. O delegado de polícia de Caeté, Reinaldo José de Magalhães, também foi avisado e partiu para a estação da serra de Gongo Soco com seis detetives. A esta altura, a Prefeitura de Caeté já havia providenciado dois caminhões e os motoristas foram encarregados de conduzir, para a Santa Casa daquela cidade, todos os feridos. Isto não ocorreu porque a Rede mandou quatro ambulâncias ao local. Os caminhões serviram para transportar mulheres e crianças. Na estação do desastre não tinha, sequer, água potável.

Outros caminhões, da Prefeitura de Barão de Cocais, estiveram na estação e levaram vários passageiros para aquela cidade. Treze feridos foram para o Hospital São João do Morro Grande, de Barão de Cocais, e 24 outros para a Santa Casa de Caeté. Ninguém se machucou além de uma mulher (Luíza Tereza de Jesus, 49 anos, Belo Horizonte) que quebrou o nariz e um rapaz (Joberto Alves de Oliveira), que fraturou o tornozelo.

O comandante do pelotão de Barão de Cocais, tenente José Júlio Fernandes, foi chamado em sua casa e reuniu a maioria de seus soldados, indo para a serra, no local do acidente, com o cabo Vicente. De Caeté, saiu o comandante do pelotão local, tenente Vinícius Maurício Vasconcelos, com dois cabos e cinco soldados. Eles ajudaram na manutenção da ordem e providenciavam socorro para os mais necessitados. O tenente Júlio e o cabo Vicente anotaram todos os pormenores para o relatório que será anexado ao inquérito aberto pelo delegado de Barão de Cocais, Sebastião Henriques, nos próximos dias, para apurar as causas do acidente. O delegado de Barão de Cocais não esteve no local onde os trens colidiram de frente.

ATÉ AS 10h, 240 minutos após o acidente, mais de 800 passageiros estavam numa ruaque dá acesso à saída para Caeté. Muitos deles, tinham estendido cobertores na terra vermelha, e dormiam. Outros ouviam rádio e alguns chegaram a ficar revoltados com a notícias que, no local do desastre, haviam morrido 40 passageiros. Eles justificavam temendo o desespero de suas famílias, em casa. Com a chegada da equipe de reportagens da Rádio Guarani, os rumores foram desfeitos, uma vez que os passageiros tiveram condições de falar para suas famílias de bem perto dos dois trens. Muitos desabafaram a "irresponsabilidade dos funcionários da Rede, que teriam dormido em serviço".

Às 11h, soou vários apitos de máquina por detrás das serras ligadas a Gongosoco. Houve uma manifestação de alegria, quando os passageiros ficaram sabendo que era o trem especial mandado pela Rede Ferroviária para apanhá-los e conduzi-los a seus destinos. O maquinista acionou o apito até a aproximação do pátio da estação. Tão logo o trem parou, houve uma correria geral. A máquina era a de número 1732. Crianças e mulheres voltaram a ter problemas, pois eram empurradas umas contra as outras. Parecia que os passageiros estavam com medo de perder o trem. A polícia voltou a agir, com cautela, e colocou ordem entre os passageiros. Muitos reclamaram ter comprado bilhete para o carro leito e que estavam sendo obrigados, naquele instante, a viajar num carro de segunda classe. Tudo deu certo e muitas pessoas acenaram para a polícia, quando o trem deu partida para Belo Horizonte, numa demonstração de alívio. O trem partiu às 11h30m, sob a orientação do chefe de segurança da Rede, coronel José Ferreira Lopes.

O superintendente de produções da RFF, Harly Anselmo, o superintendente de operações, Edilberto Guido Fernandes, e o chefe da unidade de tração do 2º Distrito de Produção, Antônio Vicente Vicentini examinaram, por longo tempo, uma maneira de retirar o carro-correio da Companhia Vale do Rio Doce, que ficou completamente danificado. Seggundo Antônio Vicentini ele não tem condições de reparos. Seu prefixo é ESF-123. O outro carro danificado é o S-201, de segunda classe.

As máquinas 1751 e 1726, que puxavam os 60 vagões de carga, também, foram danificadas. A máquina 1721, que comandava os vagões de passageiros teve sua parte de trás avariada e terá de ser desmontada para voltar ao funcionamento normal.

Os passageiros feridos e levados para a Santa Casa de Caeté são: Flávio Eduardo Passete Cavalcanti (15 anos, avenida S. Francisco, 284, Contagem); Maria Carolina Lacerda (66 anos, Colatina, Espírito Santo); André Luiz Passete Cavalcante (oito anos, avenida S. Francisco, 284, Contagem); Maria Nunes Pereira (69 anos, Governador Valadares); Bonifácio Ferreira Alves (49 anos, Colatina); Alair Luiz Alves (nove anos, Colatina); Belmiro Cân dido do Nascimento (89 anos, Aimorés), Valdivino Lima de Araújo (53 anos, Tarumirim); Sinval Valverde Arruda (13 anos, rua Martins Soares, 305, Nova ; Odair Sales da Mata (Sete anos, rua 40, número 126, bairro Maria Helena ─ Venda Nova); Conceição Rodrigues Pereira (50 anos); Isaltino Sabino Coelho (50 anos);; Elza Maria de Almeida (22 anos, rua Brasília, São Benedito, Santa Luzia); Delzelane da Cunha Alves (17 anos, rua Sete, número 42, Gorduras); Djalma Moreira dos Santos (48 anos, rua Carvino, 23, Esplanada); José Cláudio Teodoro (20 anos); Maria da Cunha Alves (50 anos); José Izidoro de Almeida (49 anos, rua Brasília, São Benedito); Maria José de Jesus (67 anos, Macedônia, MG); Maria José da Silva Medeiros (44 anos, Ipatinga).

Maria José Medeiros estava grávida de dois meses e continua internada na Santa Casa de Caeté. O médico Paulo Roberto de Abreu, que está cuidando da paciente, teme a possibilidade de a mãe perder o filho. Maria da Silva disse que esta é a quarta gestação com problemas. Os médicos Carlos Eduardo Guimarães e Afonso Rangel de Souza formaram, com Paulo Roberto, a equipe que assistiu os feridos em Caeté.

Os passageiros feridos e medicados no hospital São João do Morro Grande, em Barão de Cocais, são: Iraci Gonçalves Madeira (46 anos, Matozinhos); Nélson Atanásio (33 anos, Barão de Cocais); Argemiro de Moura (23 anos, Barão de Cocais); Melquíades Alexandre de Araújo (39, Belo Horizonte); Luiza Tereza de Jesus (49 anos, Belo Horizonte); Eliza Alves de Oliveira (61 anos, Belo Horizonte); Joana Célia Cintra (11 anos, Belo Horizonte)o Joberto Alves de Oliveira (Belo Horizonte); João Gonzaga de Oliveira (Belo Horizonte); Ademar Basílio Damásio; Eliane Nunes de Assis; Luzia Barreto Estêvão e Joel de Oliveira.

Os passageiros Luciene Marcelina de Oliveira (28 anos); Manoel Cândido da Silva (36 anos, rua Paulo Afonso, 99, Betim), Irajá Guerra de Oliveira (12 anos, rua Uberlândia, 154, Carlos Prates) e Roseval Coelho Cunha (12 anos, rua São Geraldo, 12 Nova Cintra), foram medicados no Pronto Socorro do Hospital João XXIII, em Belo Horizonte.

Mais de oitocentas pessoas se ajeitaram como puderam no trem-socorro

Jornal Estado de Minas, sábado, 17 de janeiro de 1981

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