quinta-feira, 28 de abril de 2016

06.06.1997 - Cientistas questionam reator


Cientistas questionam reator

◙ Engenheiros da Cnen e da Coppe garantem que o projeto do Exército não tem capacidade para atingir os objetivos divulgados

O coordenador de Segurança Controle da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen), Cláudio Camargo, afirmou ontem que o Projeto Atlântico, do Exército brasileiro, não deverá ser destinado à produção de radioisótopos, como alegaram os ministérios do Exército e do Meio Ambiente, em nota oficial divulgada anteontem em resposta à reportagem do JORNAL DO BRASIL. O engenheiro nuclear explica que a potência do reator de gás-grafite ─ 0,5 megawatt ─ é insuficiente tanto para a radiação para conservação de alimentos quanto para a produção de radioisótopos para aplicação em medicina, agricultura e indústria.

O coordenador afirma que a potência do reator é incompatível com as necessidades do mercado nacional de radiação. "Alguns dos nossos projetos ajudam na produção de radioisótopos para o mercado. O Atlântico não é potencialmente capacitado." Camargo diz ainda que o reator exigirá um custo acima do normal para um "projeto experimental" ─ como divulgado. "Obviamente, mais um reator para as nossas pesquisas será bem-vindo, mas exigirá, além de pessoal capacitado, verba para o enriquecimento do urânio", disse.

A Cnen tem três reatores, em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, todos em universidades federais. O reator da USP ─ o Piscina ─ produz pequena quantidade de radioisótopos para o mercado; o da UFRJ ─ o Argonauta ─ tem exclusivamente fins didáticos e o da UFMG ─ o Tigra ─ é utilizado para radiação de materiais e equipamentos. Segundo o professor de Energia Nuclear da Coppe/UFRJ, Aquilino Rosa, esses reatores fornecem cerca de 30% dos radioisótopos consumidos pelo mercado brasileiro, com um custo de produção e de capacitação de pessoal bastante inferior ao de um reator de gás-grafite.

O diretor da Coppe, Luís Pinguelli Rosa, também confirma as previsões de Cláudio Camargo. "Este é um projeto altamente suspeito. Por que montar um reator como este somente com caráter experimental? E, se é realmente destinado à pesquisa, por que eles não procuraram órgãos acadêmicos como o CNPq e a Coppe?", indaga o diretor. Pinguelli lembra um projeto do Centro de Tecnologia da Marinha, em São Paulo, onde um reator semelhante foi construído realmente para fins didáticos. "O projeto da Marinha foi feito com urânio e água natural. Além disso, o urânio não necessitava ser enriquecido. Ele poderá produzir radioisótopos com potência suficiente para a aplicação na agricultura, indústria e, principalmente, na medicina e não precisou nem de grafite, nem de urânio enriquecido."

Jornal do Brasil, sexta-feira, 6 de junho de 1997

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