segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

17.08.1978 - Missa por Elvis: uma bagunça



Missa por Elvis: uma bagunça

Cerca de dois mil fãs do cantor Elvis Presley estiveram presentes na noite de ontem na catedral da Sé na missa comemorativa ao primeiro aniversário de sua morte. Apesar de ter se iniciado em um ambiente tranquilo, terminada a missa, ocorreu um grande tumulto na catedral, causado pela presença do cantor Rogério, da gravadora RGE, que foi violentamente abordado por suas fãs, que lhe disputavam autógrafos e pedaços de roupa.

Ao som dos rocks de Elvis Presley, o altar da catedral foi literalmente invadido e tomado pelas fãs de Rogério, que gritavam alucinadamente, empurrando uma às outras. Do microfone, o cônego José Pascoal Cristófaro, celebrante da missa, pedia calma aos presentes, solicitando à imprensa que "encerrasse os trabalhos". Como o tumulto prosseguisse aumentando, foram apagadas quase que totalmente as luzes da igreja, enquanto Rogério - que tem uma música gravada em homenagem a Elvis e se veste tal qual o cantor morto - fugia em desabalada carreira pela porta lateral.

Na rua, a confusão continuou, com cerca de trezentas adolescentes perseguindo o cantor no meio de ônibus que aceleravam estridentemente. Na passagem pela porta lateral da catedral, um mendigo foi atropelado pelo cortejo, perdendo seus sapatos e desmaiando em seguida. O mendigo foi removido para um Pronto Socorro por alguns populares revoltados com a "profanação da catedral", conforme afirmavam.

A correria das fãs continuou pela praça João Mendes e só foi terminar no viaduto Maria Paula, quando o cantor Rogério, distribuindo palavrões contra tudo e contra todos, conseguiu fugir num táxi. A multidão, não satisfeita com a fuga do cantor, voltou para a catedral que, no entanto, já estava com a porta trancada. Nesse momento, uma perua da Polícia Militar se postou na frente da escadaria da Sé, com o objetivo de dar um fim à baderna. Cerca de 100 pessoas ali estavam, confundindo um incauto passante com algum cantor famoso. Um sargento da PM interviu, prendendo um rapaz.

Segundo o sargento, "o marmanjo estava se aproveitando da confusão para desrespeitar as senhoras". Manoel da Silva, prestando depoimento à PM, dizia que o rapaz "não merecia estar em nossa sociedade", por "estar dizendo palavras de baixo calão".

Por volta das 20h, os remanescentes das correrias começaram a se dispersar. A missa tinha começado às 18h20m.

A missa foi encomendada pela RCA, gravadora responsável pelos discos de Elvis Presley, no Brasil.

Cônego José Pascoal Cristófaro, vigário da Catedral, oficiou a cerimônia. "Eu contemplo esse gesto da nossa juventude, como um gesto muito bonito, que prova que o homem não é só matéria. Uma juventude que, em alguns momentos da carreira de Elvis Presley, atingiu o frenesi, hoje se recolhe a um templo para rezar pelo seu ídolo morto".

Até algum tempo atrás a Igreja Católica não permitia a realização de missas em nome de pessoas que foram atéias, hereges. O cônego Cristófaro esclarece esse pormenor: "Essa proibição existia, mas João XXIII, durante sua permanência como sumo pontífice, modificou essa estrutura. Ele dizia, que podíamos orar para qualquer pessoa, independentemente de suas convicções. Hoje, a nossa igreja aprova e apóia essas manifestações".

Questionado se a Igreja aprovava esse tipo de idolatria a certos homens, afirmou: "Se todos nós necessitamos de ídolos (na Igreja são chamados de modelos), a nossa juventude precisa em maior escala. Para pessoas sérias, pode ser uma coisa errônea, mas a psicologia explica que os modelos são necessários. Esperamos que todos os ídolos levem mensagens de paz, amor, alegria em vez de violências, guerras, erotismo".

ELVIS E A MÚSICA SACRA

Com relação a Elvis Presley, salienta: "No tempo do seminário, a cultura eclesiástica que recebi era baseada mais na música clássica do que na popular. Nós ouvíamos muito Bach, Beethoven e outros mestres, tanto que passei a apreciá-los, até hoje. A partir do momento em que saímos do seminário e entramos em contato com nossa gente, nosso povo, viemos a conhecer Elvis Presley. Acabei de ser presenteado com dois discos do ídolo (He Walks Beside Me - temas sacros; Sings for Children - músicas feitas para crianças). Ester dois discos são uma pequena amostra de que ele também teve seu lado bom. Gostaria que Elvis Presley fosse lembrado, justamente por esse seu lado, ou seja, de sua espiritualidade, de suas orações, e de quando pensou nas crianças ao gravar um disco dedicado a elas. Infelizmente a imprensa procura propagar o lado ruim do cantor, lembrando as drogas, o álcool, as neuroses.

Traçando um paralelo entra a juventude que mitificou Elvis Presley e a juventude atual, o cônego Cristófaro, acrescenta: "Elvis apareceu no pós-guerra, num momento em que a juventude tinha extrema necessidade de mitos, justamente pelo momento histórico que estevam vivendo.

Atualmente nossa juventude está menos afoita; porém, nesse momento não existem ídolos com carisma para substituir uma pessoa como Elvis Presley. Estamos vivendo um "momento vazio", não temos lideranças em nenhum campo, quer seja o político, o social. Como a necessidade da existência de modelos é patente, pode ser que de uma hora para outra surjam os novos ídolos. Por exemplo, João XXIII e John Fitzgerald Kennedy apareceram de repente".

Antes do início da missa e após seu final, músicas de Elvis Presley invadiam o imenso interior da Catedral, comovendo os presentes e criando forte clima emocional. Muitas lágrimas rolaram das faces, reafirmando que o ídolo continua vivo dentro de cada um, e o vazio deixado com sua morte não será facilmente preenchido.

Greves e desmaios e Memphis

MEMPHIS, TENNESSEE (UPI) - Ignorando os piquetes dos policiais em greve e ajudando inúmeros mascates a ficarem ricos, milhares de fãs se dirigiram ontem à Mansão Graceland, para reverenciar o primeiro aniversário de morte de Elvis Presley.

A morte do "Rei do Rock", provocada por ataque cardíaco, no ano passado, deflagrou uma série sem precedentes de manifestações de pesar que nenhum outro artista recebeu.

A peregrinação dos fãs de Presley a Memphis, durante esta semana para comemorar o acontecimento, foi drasticamente interrompida por uma greve de policiais e bombeiros, a qual fez com que as autoridades decretassem um rigoroso toque de recolher, do anoitecer ao alvorecer, tornando Memphis, à noite uma cidade deserta.

Vester Presley, tio de Elvis, declarou que o toque de recolher resultou na diminuição do número de visitantes. Porém, as pessoas que visitaram a mansão se parecem, em sua opinião, "um pouco com um rebanho nervoso de gado, ansiosas para chegarem a Graceland".

Ontem, porém, cerca de 17 mil pessoas, muitas trazendo cravos e outras chorando excessivamente, passaram pelos portões de Graceland para visitar o túmulo de Elvis.

O tio de Elvis, explicou que, em vida, o "Rei do Rock" tinha um certo magnetismo pessoal, que atraia as pessoas. "Não acreditei", disse, "que esse magnetismo durante tanto tempo, porém, essa atração parece que se fortalece a cada dia".

Porém, equiparando-se ao envolvimento emocional das pessoas com o cantor, estão os lucros obtidos com a venda de lembranças.

Robert Barnett, residente em Wausau, declarou que já gastou mais de 1.200 dólares (22 mil e 416 cruzeiros) na aquisição de lembranças de Elvis, desde que chegou a Memphis, na semana passada, acrescentando que compra tudo o que tenha a fotografia do "Rei do Rock".

As fotografias de Presley são vendidas a 1 dólar (18 cruzeiros e 68 centavos) segundo anunciou Bruce Shelton, mascate de 27 anos, residente em Nashville. Shelton disse que o mais importante é ter lucro, e que a competição entre os mascates ajuda bastante.

Vester declarou que, antes que o toque de recolher fosse decretado, na sexta feira, cerca de 12 mil pessoas visitaram o túmulo de Elvis, por dia.

Quando a notícia da morte de Elvis foi divulgada, no ano passado, milhares de fãs, perturbados com o acontecimento, chegaram a Memphis para homenagear o "Rei do Rock". Muitos até estavam histéricos. Centenas de outros se recusaram a abandonar a frente da mansão até que o carro funerário, transportando o corpo de Elvis para o cemitério, deixou Graceland.

Segundo os críticos de música, Elvis mudou, definitivamente, o curso da música popular quando abriu caminho para a fama, durante a década de 1950, com seus sucessos "Heartbreak Hotel" e "hound Bob".

Depois que foi realizara uma tentativa para roubar o corpo do cantor e de saquear seus pertences, o corpo de Elvis foi removido e enterrado em Graceland.

Além disso, a família estabeleceu um horário de visitação pública. As autoridades de Memphis avaliaram em 100 mil o número de pessoas que visitarão o túmulo de Elvis, durante este mês.

O dia 16 de agosto ainda não é um novo dia nacional de dor, mas Memphis continuará a ser para sempre sua cidade natal, o rock sua criação máxima e sua rebelião, vaga mas poderosa, uma mensagem.

Folha de São Paulo, quinta-feira, 17 de agosto de 1978

Um comentário:

  1. mentira..a bagunça começou pois tira uma manifestação dos professores..como um imbecil escreve tanta mentira

    ResponderExcluir